quarta-feira, 16 de maio de 2007

Dia Cinza, dia de silêncio, dia de partida

Sou jornalista há 10 anos e portanto, como não sou novata nisso deveria saber que em um dia qualquer iria acordar pela manhã e me deparar com a pauta que eu não queria cobrir, com a notícia que jamais queria ter que dar... e assim amanheceu o sábado, dia 12 de maio, dia cinza, dia de silêncio, dia de partida.

Apesar de não saber como eu iria conseguir, eu queria escrever sobre o Cartaxo. Saí em busca das fotos de sua militância para ilustrar a matéria e de ir ao encontro de alguns companheiros em comum de partido como o senador Siba Machado, a Rose Scalabrin e o Cláudio Ezequiel para ajudar na veiculação de uma nota do PT e obter mais informações.

Eu não tinha coragem de ligar pra Cleísa (amada esposa dele) e nem para as fiéis escudeiras, Paty e Meire, as quais eu vinha enchendo o saco a semana toda querendo saber como ele estava. As notícias, infelizmente não eram nada animadoras.

Digo fiéis escudeiras porque nunca deixavam transparecer a verdade do estado crítico de saúde que o Cartaxo enfrentava. E pelo pouco que pude conhecer dele, sei que foi sob sua orientação. Aposto que ele não queria que o vissem fragilizado, sem poder fazer muita coisa e debilitado, bastante debilitado. Ele já vinha sendo visto sem os cabelos por causa da quimioterapia e isso já era difícil o suficiente.

Coletados o material e as informações, e agora? O que escrever? Fiquei horas na frente do computador. Os dedos passeavam pelo teclado e eu não sabia por onde começar.

E o mais difícil: eu estava editando o jornal, teria que escolher a foto da capa, do velório do meu querido amigo e líder político.

Meu Deus! Que nó na garganta, que choro sufocado, que dor inexprimível.

O Cartaxo é (é porque pra mim a morte é apenas um estágio temporário que precede a vida eterna) uma pessoa indescritível. Um amigo fiel, sincero e solidário. Aquele que não passava a mão na cabeça diante dos erros, nem deixava pra resolver amanhã as coisas que eram pra resolver hoje, não mandava recados, não invadia o espaço dos outros, não tolerava a falta de respeito, a mentira, práticas rasteiras e a incompetência.

Eu tive a chance de trabalhar com ele nas campanhas eleitorais do PT, e quem já trabalhou com ele sabe do que estou falando. Sempre teve posturas firmes, dizia “não” quando era preciso e defendia os que lhe eram fiéis. Não é a toa que foi escolhido o coordenador das últimas mais importantes campanhas majoritárias da Frente Popular. E sobre isso pairava uma dicotomia em torno do Cartaxo, como pode alguém assim ser tão querido??? Ser eleito deputado com 4.500 votos???

Sua sinceridade, coragem, dignidade e porque era uma pessoa verdadeira, articulada, responsável e competente acho que é a resposta.

Deus em sua infinita misericórdia, sempre sabe o que faz. Permitiu que um câncer se instalasse no organismo aparentemente forte do Cartaxo. Aquele homem, às vezes “stressado”, por ser muito exigente e extremamente zeloso em tudo o que fazia, chegando a ser intolerante com o erro. E foi na doença que ele parou para refletir mais sobre sua vida, sobre suas prioridades. Pude ouví-lo falando a respeito, quando o acompanhei a uma entrevista com o amigo Alan Rick, logo que ele voltou da primeira fase do tratamento.

Com muita fé, grato pelas orações, rezas e energias positivas dos amigos e de outras pessoas, relatou com ânimo uma experiência com irmãs crentes de uma pequena Igreja Evangélica que visitou e que de lá tinha saído renovado. Disse que teve a certeza de que existe Deus, acima de nós que criou tudo e todos, porque foi o paciente 99 de um grupo de 100 que experimentaria um medicamento eficaz contra o câncer que estava entrando no mercado brasileiro. Vencida a primeira batalha!!

Nós três oramos juntos naquela tarde. Um momento muito forte e especial na presença do Senhor.

Mas como todo inimigo traiçoeiro o câncer apenas recuou para contra-atacar! Depois de ganhar a eleição de deputado e assumir a tarefa de líder do governo, ele mal pôde colocar em prática os projetos que tinha para a melhoria das condições de vida da população rural, do pequeno produtor, de quem ele não abria mão de trabalhar em favor, desde quando chegou ao Acre, mesmo quando voltou dos Estados Unidos e agora na Assembléia.

Mesmo sentindo fortes dores, ele não reclamava, estava confiante na cura, com fé que Deus iria por fim àquele sofrimento angustiante de dias e noites em um leito de hospital. Infelizmente não foi da maneira que nós, em nossa pequenez humana, gostaríamos que fosse, mas o Senhor em sua imensa sabedoria, o libertou da doença.

Agora fica a lacuna, a saudade, a lembrança, o sotaque nordestino ecoando em nosso ouvido, o semblante altivo, o exemplo de vida, de homem público, de companheiro com quem aprendi muito...